A demissão por justa causa ocorre quando a pessoa que trabalha em regime celetista (ou seja, sob as regras da CLT) comete uma falta grave ou passa por alguma situação que a impeça de permanecer na empresa.
Este é um recurso do empregador previsto por lei. De acordo com a legislação trabalhista, quando o trabalhador é demitido por justa causa, deixa de receber parte dos seus direitos e verbas rescisórias.
Porém, para demitir trabalhadores sem direitos, a empresa deve obedecer ao que diz as regras do artigo 482 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
O Brasil é o país com maior índice de turnover do mundo. É o que mostram números do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). De acordo com uma pesquisa realizada pela Robert Half, o país registrou um aumento de 56% na rotatividade em 2022.
Há uma série de fatores que podem influenciar a rotatividade involuntária, que ocorre quando a organização decide demitir o profissional mesmo contra a sua vontade.
- O que é demissão por justa causa?
- O STF pode proibir demissão sem justa causa?
- O que diz a CLT?
- Quais os motivos que caracterizam a justa causa?
- Demissão por justa causa na reforma trabalhista
- Principais dúvidas
- Como o RH pode evitar uma demissão por justa causa
- Por que o RH deve se preocupar com o turnover?
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O que é demissão por justa causa?
A demissão por justa causa pode ser realizada perante qualquer ato grave estabelecido por lei, cometido pelas pessoas contratadas numa empresa e que compromete a confiança na relação empregatícia existente entre as partes.
Neste caso é importante estar atento. Mesmo que a empresa alegue demissão por justa causa, não significa que a decisão esteja correta.
Desta forma, um desligamento nesta modalidade sem embasamento legal pode levar a organização a enfrentar processos trabalhistas.
O STF pode proibir demissão sem justa causa?
Não se trata disso, o que está em discussão recente no Supremo Tribunal Federal (STF) é que passe a ser necessário que as empresas justifiquem o motivo do desligamento, mesmo em uma demissão sem justa causa.
Tudo começou em 1997, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cancelou a adesão do Brasil na Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Então, o que o STF voltou a analisar desde o início de 2023 é a validade deste decreto assinado pelo ex-presidente.
O que a Convenção 158 determina é a especificação de uma justificativa que valide a demissão feita por parte do empregador sem justa causa.
Desta forma, esta motivação poderia ser baseada no comportamento, redução de gastos, desempenho ou habilidades técnicas, por exemplo.
Por fim, o que está sendo discutido é que o desligamento só pode ocorrer quando existe um motivo justificado. Portanto, não se trata de proibir a demissão sem justa causa no Brasil.
O que diz a CLT?
De acordo com a legislação, entende-se por ato grave a condenação criminal, abandono de emprego, embriaguez e ofensa moral, por exemplo. Dentre esses, o Art. 482 da CLT relaciona 14 motivos que levam a demissão por justa causa.
Contudo, não basta ter um motivo para a demissão por justa causa. Esta justificação deve se enquadrar nas situações previstas na legislação e, em caso de dúvidas, um consultor jurídico ou sindicato deve ser acionado.
Antes da punição severa com a demissão por justa causa, as advertências em alguns casos podem ser a solução mais adequada para corrigir algum comportamento ou ato inadequado.
Quais os motivos que caracterizam a justa causa?
De acordo com o texto do Art. 482 da CLT, os parâmetros que se consideram premissas à justa causa para rescisão do contrato de trabalho por parte do empregador, são:
Ato de Improbidade
Neste caso, compreende o furto e toda ação desonesta do empregado visando uma vantagem para si próprio. São exemplos de conduta inaceitável adulterar documento pessoal como o endereço residencial para ter direito ao benefício do vale-transporte ou falsificar o atestado médico.
Nesse cenário, atos como esses revelam desonestidade, omissão, fraude, abuso de confiança e má fé.
Incontinência de Conduta ou Mau Procedimento
Ambos se referem ao comportamento inadequado da pessoa contratada pela organização.
A incontinência de conduta ocorre quando a pessoa que trabalha na empresa comete ofensa ao pudor, pornografia ou obscenidade, desrespeito aos colegas ou à empresa.
Por outro lado, o mau procedimento caracteriza-se por atos que ofendem a dignidade como: assédio moral, atitudes machistas, racismo, humilhações (“bullying”), ameaças, intimidações, furtos e até mesmo o descumprimento do regulamento interno da empresa.
Negociação Habitual
Também pode resultar em uma demissão por justa causa se a pessoa contratada pela empresa (sem autorização expressa do empregador) exercer atividade de forma habitual no mesmo segmento e tirar vantagem econômica.
Ou mesmo exercer outra atividade que, embora não concorrente, prejudique o exercício de sua função na empresa.
Além das justificativas acima, são motivos que podem levar o desligamento por justa causa:
- Condenação Criminal sem suspensão da execução da pena;
- Desídia: baixa produtividade ou falta de habilidade no desempenho das respectivas funções;
- Embriaguez habitual ou em serviço;
- Compartilhamento e violação de dados e informações sigilosas da empresa;
- Ato de indisciplina ou insubordinação: desrespeito às normas e não cumprimento às ordens;
- Abandono de emprego, ausência do trabalho por 30 dias consecutivos sem justificativa;
- Ofensas físicas, seja a honra ou integridade física praticada contra qualquer pessoa no serviço, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- Lesões à honra e à boa fama: insultos, calúnias ou injúrias contra superiores hierárquicos ou colegas de trabalho, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- Práticas incessantes de jogos de azar dentro da empresa, seja no horário de trabalho, ou não.
- Atentar contra à Segurança Nacional;
- Perda da habilitação em decorrência de conduta dolosa do empregado e que impede o profissional de desempenhar suas atividades (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017).
Demissão por justa causa na reforma trabalhista
A reforma trabalhista (Lei nº 13.467/ 2017) trouxe algumas mudanças na realidade laboral. No texto, a modalidade de demissão com justa causa incluiu a perda da habilitação causada de forma intencional como um dos requisitos estabelecidos.
É importante deixar claro que a mudança em questão diz respeito aos trabalhadores que precisam de habilitação para o exercício da atividade laboral, como ocorre nas profissões de motorista, por exemplo.
Principais dúvidas
A justa causa é uma punição máxima que resulta em demissão involuntária motivada por uma falta grave da pessoa trabalhadora contra a empresa.
Acompanhe as principais questões sobre a lei que trata do desligamento por justa causa.
Quais fatores configuram justa causa?
Além dos motivos que caracterizam faltas graves na CLT, também são considerados alguns fatores que podem ajudar o empregador na hora de tomar a decisão para este tipo de desligamento, sendo eles:
- Proporcionalidade
Quando o ato cometido pelo trabalhador de fato se enquadra na falta grave prevista na legislação ou diversas advertências e suspensões já foram aplicadas ao trabalhador antes do empregado optar por decisões mais drásticas.
- Gravidade
Para avaliar a gravidade, primeiro é preciso entender na sua individualidade as motivações da pessoa envolvida. Neste caso, é possível avaliar a sua personalidade, intencionalidade e as razões que levaram à prática da falta grave.
- Atualidade
A demissão por justa causa deve ser imediata ou logo após a empresa ter concluído a investigação. Ou seja, uma vez que a situação foi avaliada e a decisão de fato baseada pelo Art. 482, a empresa não pode esperar para iniciar o processo de desligamento.
Vale ressaltar que, caso o empregado já tenha tomado suspensões ou advertências por alguma razão, a empresa não pode demiti-lo pelo mesmo motivo. Isso caracteriza a dupla punição, proibida por lei.
Quais direitos o trabalhador perde na demissão por justa causa?
- A empresa fica isenta de cumprir com o aviso-prévio;
- Não pode sacar o saldo do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço);
- Deixa de receber a multa de 40% do FGTS depositado no período do contrato de trabalho;
- Não recebe nenhum pagamento referente ao 13°;
- Não recebe o acréscimo de ⅓ de férias constitucional;
- Não tem direito ao Seguro Desemprego.
Quais são os direitos incluídos nas verbas rescisórias da justa causa?
- Salário em relação aos dias trabalhados;
- Férias vencidas proporcionais aos meses trabalhados;
- Valor proporcional do Salário Família pelos dias trabalhados;
- Pagamento do saldo de banco de horas, horas extras ou adicionais.
Justa causa suja a carteira?
Há alguns anos atrás, ter vários registros resultava em ‘carteira suja’. Diferente do que se vê hoje, essa era a época em que se buscava estabilidade profissional e a rotatividade não era tendência no mercado de trabalho brasileiro, o que representa um desafio para empresas de todo país.
Para se ter uma ideia, segundo dados do CAGED de 2022, foram registrados 19,1 milhões de pedidos de desligamento do emprego formal. Com base nesse total, a participação da demissão sem justa causa representou 54,49%.
Sobre trabalhadores dispensados por justa causa, a atual legislação proíbe o registro deste tipo de demissão na carteira de trabalho.
Na verdade, qualquer informação que desabone a conduta profissional e atrapalhe sua inserção no mercado de trabalho pode ser motivo de ação por danos morais contra a empresa.
E se a demissão por justa causa for injusta?
Mesmo que a empresa relacione o desligamento por justa causa a algum dos motivos previstos na legislação, não significa que a decisão esteja certa.
Portanto, caso a pessoa demitida considere que houve exagero por parte do empregador, pode recusar-se a assinar o termo de rescisão e tem o direito de pedir judicialmente uma reversão para a demissão sem justa causa.
Neste caso, a empresa deve provar judicialmente o motivo e se ela não conseguir provar ou a demissão estiver incorreta, o empregado pode receber as verbas rescisórias, e ainda uma indenização por danos morais.
Como o RH pode evitar uma demissão por justa causa
Para evitar que demissões por justa causa ocorram na empresa, primeiro o RH deve investir em estratégias que reduzam as chances de que desligamentos neste contexto aconteçam.
Neste sentido, as principais práticas que contribuem para isso são:
- Investir em processos seletivos com decisões tomadas com base em dados;
- Criar Planos de Desenvolvimento Individuais (PDI) e oferecer oportunidades de crescimento para líderes e liderados;
- Oferecer benefícios de treinamentos e desenvolvimento para aperfeiçoar habilidades e as competências dos talentos;
- Aplicar uma pesquisa de clima organizacional para entender a real percepção das pessoas do ambiente de trabalho;
- Fazer análise de remuneração, benefícios, plano de carreira, cargo e salário;
- Investir em programas para estimular o reconhecimento profissional.
Contudo, existe uma série de fatores internos que podem levar a este tipo de demissão.
Entender qual é a percepção das pessoas na empresa em relação ao ambiente laboral ajuda a identificar o que está acontecendo ao entorno delas e que podem gerar impactos negativos na organização.
Por que o RH deve se preocupar com o turnover?
Turnover voluntário ou involuntário, independente da modalidade, impacta diretamente na lucratividade do negócio devido aos custos com os processos de desligamento e contratação de novos talentos.
Especialmente no caso da demissão por justa causa, gera um clima de tensão entre as pessoas que permanecem na corporação, o que prejudica a imagem e contribui para um clima organizacional ruim.
De acordo com os insights da mais recente pesquisa Desafios do RH em 2023, realizada pela Think Work em parceria com a Atlas, ‘fortalecer a cultura organizacional’ ocupa o topo da lista (35%) entre os principais desafios previstos para esta área.
Além disso, promover a transformação digital (25%) e investir em indicadores de people analytics (20%), aparecem neste estudo como algumas das soluções para diminuir os riscos que o turnover representa para os negócios.
Por essa razão, o grande desafio está em atrair talentos qualificados e promover a retenção desses profissionais na empresa.
Portanto, criar um clima atrativo na organização e ajudar as pessoas a se desenvolverem deve ser a prioridade para a área de RH que está atenta a esta nova realidade.