Direito de Recusa: o que significa e como funciona

O direito de recusa garante a saúde e segurança das pessoas trabalhadoras expostas a situações de risco grave e iminente

O direito de recusa é um benefício em defesa da vida das pessoas trabalhadoras. Assegurado pela Consolidação da Leis Trabalhista (CLT), Organização Internacional do Trabalho (OIT), Acordos Coletivos e Constituição Federal, a interrupção do trabalho em caso de risco grave e iminente é prevista por lei.

O Artigo 7° da Constituição Federal estabelece:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social:

XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

Segundo pesquisa da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN), no período de janeiro a maio de 2022, o Brasil registrou 2,9 milhões de pedidos voluntários de demissões.

Apesar do movimento mundial da Grande Renúncia ter chegado ao Brasil, a verdade é que as demissões voluntárias estão restritas a um grupo de trabalhadores. Para a parte deles, o mercado de trabalho é concorrido.

A realidade é que, por desconhecimento ou pelo receio de perder o emprego, muitos trabalhadores colocam a sua saúde e segurança em risco. 

Embora esse seja um direito garantido, ainda é um assunto pouco conhecido. Assim, neste texto serão explorados os detalhes sobre o direito de recusa.

O que é o direito de recusa?

O direito de recusa garante a saúde e segurança das pessoas trabalhadoras expostas a situações de risco grave e iminente (Think Work)

Qualquer profissional que tem exposto a sua saúde e segurança à situação de risco, tem o direito de recusa no trabalho

Ou seja, este trabalhador pode se recusar – de forma total ou parcial – a exercer sua função em situações em que coloque em risco a sua integridade física, podendo ocorrer acidentes, doença relacionada ao trabalho ou lesão grave.

Vale ressaltar mais uma vez que o direito de recusa garante a saúde e segurança das pessoas trabalhadoras expostas a situações de risco grave e iminente

Pode ocorrer falta grave também quando a empresa exige que o profissional realize atividades não inerentes à sua função, ou seja, não previstas e acordadas em contrato individual de trabalho.

Portanto, essa recusa deve ser devidamente formalizada por quem está submetido ao trabalho. E em caso de fraude ou solicitação indevida, o profissional corre o risco de sofrer demissão por justa causa.

  • O que significa risco grave e iminente?

De acordo com a NR3, “considera-se grave e iminente risco toda condição ou situação de trabalho que possa causar acidente ou doença com lesão grave ao trabalhador.”

Desta forma, de acordo com a exposição do trabalhador ao risco avaliado, são classificadas pelo Auditor Fiscal do Trabalho, as consequências e as probabilidades de acidentes. Assim, a caracterização do risco grave e iminente considera a probabilidade de um resultado em potencial.

Na tabela da classificação das consequências, por exemplo, um risco pode prejudicar a saúde e a integridade física ao provocar lesão ou sequela permanente ou temporária.

O que a legislação diz sobre o direito de recusa?

Ao todo, 37 NRs contribuem para promover a saúde e segurança no trabalho (senivpetro |Freepik)

Além do Ministério do Trabalho e outras entidades, participam da elaboração das Normas Regulamentadoras (NRs), os seguintes órgãos:

  • Ministério da Saúde, dos Transportes e Previdência Social;
  • ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária);
  • ANP (Agência Nacional do Petróleo);
  • ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Sobre o direito de recusa, a lei considera falta grave por parte da instituição que deixa de cumprir com as obrigações legais de saúde e segurança no trabalho e contratuais acordadas entre empregado e empregador.

A legislação prevista no Artigo 483 da CLT prevê a rescisão indireta caso as empresas não cumpram com as políticas de saúde, segurança e bem-estar no trabalho.

Motivos para a rescisão indireta

  • Exigir do trabalhador serviços superiores que estejam além das suas forças físicas ou intelectuais, que não estejam pactuados em contrato, inerentes a sua função, contrários aos bons costumes ou proibidos por lei;
  • Usar da autoridade para tratar profissionais com dureza excessiva ou mesmo faltar com educação ou discriminar;
  • Colocar a saúde e segurança da pessoa trabalhadora em risco;
  • Deixar de cumprir com as obrigações legais do contrato de trabalho como o pagamento de salário, benefícios legais ou falta do depósito do FGTS, por exemplo;
  • Cometer ato que lese a honra ou boa fama de quem trabalha ou sua família;
  • Salvo em caso de legítima defesa ou de outrem, insultar ou ofender fisicamente trabalhadores ou sua família;
  • Reduzir o salário ou exigir que empregados realizem funções sem que tenham a remuneração inerente ao cargo.

Conforme explica a atual legislação trabalhista, é responsabilidade da empresa orientar e fiscalizar as diferentes hierarquias (gerência, supervisão e diretoria) para que não cometam faltas que resultem em demissão indireta. 

Direito de recusa e Norma Regulamentadora (NR)

Convém ressaltar que o direito de recusa ao trabalho está estabelecido na NR1 – Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Operacionais. A NR3 apenas explica e regulamenta ‘o que é risco grave e iminente’.

Neste caso, a NR1 estabelece as diretrizes e requisitos relativos à Segurança e Saúde no Trabalho – SST e o gerenciamento de riscos ocupacionais que constituem o Programa de Gerenciamento de Riscos – PGR

No item 1.4 da NR1, sobre os direitos e deveres, cabe ao trabalhador:

  • 1.4.3 – “O trabalhador poderá interromper suas atividades quando constatar uma situação de trabalho onde, a seu ver, envolva um risco grave e iminente para a sua vida e saúde, informando imediatamente ao seu superior hierárquico.”
  • 1.4.3.1 – “Comprovada pelo empregador a situação de grave e iminente risco, não poderá ser exigida a volta dos trabalhadores à atividade enquanto não forem tomadas as medidas corretivas.”

Portanto, quem trabalha em situação que apresenta risco de acidentes ou doenças conforme descritos na NR3, está no direito de recusa, uma vez que o empregador deixa de cumprir as disposições legais sobre segurança e saúde do trabalho expostas na NR1.

Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)

A Convenção 155 foi aprovada em Genebra em 1981, onde aconteceu a Conferência Internacional do Trabalho, com o objetivo de garantir uma política de saúde e segurança no trabalho. No Brasil, está em vigência desde 1993.

Entre as normas e princípios desta convenção, é possível destacar a prevenção de acidentes e redução de riscos à saúde no trabalho, a obrigação da empresa de fornecer aos trabalhadores equipamentos de proteção individual e coletivo e a implementação de ações em caso de acidente no trabalho.

Em qual momento o empregado pode se recusar a trabalhar?

Além de se recusar a realizar a tarefa em questão, o trabalhador pode acionar a empresa na esfera trabalhista (aleksandarlittlewolf | Freepik)

Toda pessoa que trabalha e sente que a sua integridade física e/ou saúde está exposta a riscos, pode interromper as suas atividades e exercer o direito de recusa.

Neste caso, sentir-se em perigo não é suficiente. Antes de mais nada, é preciso comprovar que o ambiente de trabalho ou função exercida não atendem os critérios e condições de trabalho assegurados pelas legislações.

Reforçando o que diz o artigo 483 da CLT, além de profissionais deixarem de trabalhar ao constatar risco à sua vida e saúde, eles também podem recusar ao trabalho caso sejam exigidas tarefas que demandem mais do que suas forças, proibidas por lei, diferentes do que consta em contrato individual ou contrárias aos bons costumes.

Como provar o direito de recusa?

Em qualquer situação que assegura o direito de recusa ao trabalho, ao interromper as atividades, a pessoa trabalhadora deverá notificar seu superior. Nesta situação, o recomendado é:

  • Fazer registro em fotos e vídeos para comprovar a situação e mostrar a gestores e departamento responsável as atuais condições de trabalho;
  • Comunicar a outros profissionais da organização para que todos estejam cientes da situação e possam testemunhar num eventual processo trabalhista.
  • Relatar formalmente em um documento os detalhes do acontecimento e notificar a organização sobre o problema.
  • Caso a irregularidade denunciada seja comprovada e não seja solucionada, a pessoa que acionou o seu direito de recusa pode entrar com o pedido de desligamento indireto, conforme art. 483 da CLT, tendo todos os seus direitos garantidos.

É importante alertar que, se a empresa comprovar que profissionais estão negligenciando a realização das suas atividades e agindo de má fé, poderão sofrer demissão por justa causa e, desta forma, deixar de ter alguns dos seus direitos garantidos.

As consequências do direito de recusa

Além de tudo, o acionamento do direito de recusa pode trazer impactos negativos para a imagem da empresa (wavebreakmedia micro | Freepik)

Empresas que oferecem ambientes cada vez mais seguros aos trabalhadores não só cumprem com as NRs e medidas preventivas para evitar que situações cheguem ao extremo, como também cuidam da saúde da sua força de trabalho.

Além de prejuízos financeiros, o direito de recusa pode gerar diversas consequências para o empregador. Em alguns casos podem ser:

  • Pedido de demissão indireta por parte do funcionário;
  • Pagamento de indenizações por danos morais em casos de ações trabalhistas;
  • Impacto negativo na imagem da empresa e na marca empregadora;
  • Dificulta a atração de candidatos em potencial para vagas futuras ou em aberto. 

Como promover a saúde e o bem-estar no trabalho e evitar o direito de recusa

Profissionais valorizam aspectos tão ou mais importantes que o salário, como a flexibilidade e o bem-estar no ambiente de trabalho (azerbaijan stockers | Freepik)

As relações de trabalho passaram por mudanças após a pandemia e, desde então, as prioridades das pessoas que trabalham passaram a ser outras. 

Entre a preferência por modalidades mais flexíveis de trabalho, como o híbrido, uma pesquisa da Microsoft revela que para 71% de profissionais no Brasil, a saúde e bem-estar estão no topo da lista entre as prioridades.

Portanto, promover a qualidade de vida é o grande desafio deste novo cenário para as empresas. 

Para melhorar a qualidade de vida no trabalho e evitar situações que envolvam o direito de recusa, iniciativas que estimulam a comunicação interna e o bom clima organizacional funcionam, mas não são suficientes para detectar riscos.

Contudo, para contribuir com a saúde no trabalho, as empresas devem contar com laudos técnicos elaborados por equipes especializadas em Saúde e Segurança do Trabalho (SST). 

Neste caso, é importante:

Assegurar que a empresa proporciona um ambiente seguro de trabalho

Para isso, equipes contratadas especializadas em segurança do trabalho verificam se as Normas Regulamentadoras estão sendo adotadas pela empresa.

Nesse primeiro passo, como ação preventiva, a NR9 – Programa de Prevenção dos Riscos Ambientais (PPRA) identifica os riscos que o ambiente laboral pode oferecer e propõe soluções para o controle ou extinção das causas. 

Reduzir os riscos e oferecer melhorias nas condições laborais

Seguindo com os princípios das normas e programas de saúde, higiene e segurança, a próxima etapa é a regulamentação pela NR4 – Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e de Medicina do Trabalho (SESMT). 

Neste caso, o ambiente laboral é avaliado por técnicos ou engenheiros de segurança do trabalho e profissionais de medicina do trabalho.

Investir em programas internos e ações de saúde e bem-estar

Como último passo, a organização deve oferecer treinamento a um grupo de trabalhadores de diferentes departamentos para que conheçam os riscos de acidentes e doenças ocupacionais no ambiente de trabalho. 

Assim, a empresa forma uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) para analisar as condições diárias de trabalho e promover iniciativas de prevenção. 

O papel do RH na saúde e segurança do trabalho

O RH deve agir de maneira condizente para respeitar o funcionário e ao mesmo tempo não prejudicar a empresa (Freepik)

A lei é pensada cuidadosamente para preservar e garantir os direitos e deveres de empregados e empregadores, cabendo ao departamento de Recursos Humanos contratar, fazer a gestão de pessoas e cuidar do bem-estar que envolve as relações trabalhistas. 

Neste caso, após qualquer irregularidade identificada no trabalho, o RH é o primeiro setor que deve ser acionado para que se comprove a coerência no direito de recusa. 

Após a avaliação, o próximo passo é averiguar conforme NR1, se de fato o ambiente envolve risco. 

Desta forma, após o diagnóstico e se necessário, uma equipe de SST é acionada ou são tomadas outras medidas que evitem situações conflitantes e desgastantes para todas as partes.

Da mesma forma, é responsabilidade do RH garantir que os funcionários exerçam atividades condizentes com seus cargos e funções e, portanto, se certificar que há um ambiente de respeito e seguro para todas as pessoas na organização.

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