Entender sobre dissídio pode ajudar as empresas a agirem da forma correta e a evitarem dores de cabeça
Dissídio é uma palavra que tem origem no termo “divergência”. E, apesar do significado sugerir algo do qual se quer distância, é tema que faz parte do cotidiano de pequenas, médias e grandes empresas. Ainda assim, suas peculiaridades geram dúvidas, tanto nos funcionários quanto nas equipes de RH.
O dissídio é muito mais que uma simples atualização salarial, como muitos podem pensar. Então, do que se trata este tema e como abordá-lo da forma mais inteligente dentro de uma empresa?
Neste texto, serão detalhados os principais pontos sobre o dissídio.
O que é dissídio
Para explicar o que é dissídio, é necessário contar um pouco sobre as negociações. É comum que, de tempos em tempos, entidades de classe como sindicatos, federações e confederações se reúnam com as empresas (ou seus sindicatos) a fim de negociar regras relativas aos trabalhadores que representam.
Quando este acordo é convencionado entre sindicato do trabalhador e sindicato patronal fica estabelecido o que se chama de Convenção Coletiva de Trabalho. Neste momento, geralmente, são definidos salários, estabilidades, adicionais, entre outros direitos que podem ser plano de saúde, vale-refeição, vale-transporte etc.
Porém, nem sempre, as partes chegam a um acordo nessas reuniões. E assim é instaurado o dissídio coletivo, ou seja, quando não há um acordo diante da negociação direta entre sindicato de trabalhadores e patronal.
Portanto, se entende o dissídio como uma forma de solução de conflitos coletivos de trabalho quando se faz necessário o auxílio da Justiça do Trabalho, que elabora o documento. É no dissídio que o Poder Judiciário resolve o entrave entre empregados, representados por seus sindicatos e empregadores.
Dissídio, acordo e convenção coletiva de trabalho: diferenças
Todos esses nomes (dissídio, acordo e convenção coletiva) dizem respeito ao que é alinhado entre empresas e sindicatos. Mas as diferenças são muitas.
De forma bem simplista e resumida se pode dizer que o acordo envolve menos entidades que a convenção. Já o dissídio, envolve mais entidades que o acordo e a convenção, uma vez que trabalha também a Justiça do Trabalho neste caso.
Segundo a Constituição Federal, entre as atribuições dos sindicatos está “a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas” (Art. 8º, Inciso III). Assim sendo, a lei maior determina que somente o sindicato deve representar os trabalhadores perante o empregador. E isso se faz de diversas formas.
Acordo coletivo de trabalho
O acordo coletivo de trabalho, ou ACT, é o instrumento legalmente utilizado para regular as relações de trabalho entre empregados e empregadores. Ele é firmado anualmente ou de acordo com o interesse das partes. Se trata de um conjunto de cláusulas que regulamentam a relação de trabalho de uma determinada categoria.
Ele tem sua homologação na Delegacia Regional do Trabalho e, a partir daí, passa a ter caráter e força de lei. Desta forma, em caso de descumprimento, podem ser aplicadas punições.
Convenção coletiva de trabalho
Já a convenção coletiva de trabalho é quando um acordo é feito com a entidade representativa do empregador – o sindicato patronal.
Quando há convenção coletiva, as cláusulas impõem cumprimento de todas as empresas e trabalhadores da base dos sindicatos signatários, em razão de seu valor legal.
Nas negociações, é comum, por parte do sindicado que representa os empregados, a busca de reajustes salariais, melhores condições de trabalho, aumentos reais, antecipações salariais, anuênios, auxílio refeição ou creche, entre outros benefícios.
Também neste momento, são firmadas condições de respeito a outras garantias estabelecidas por lei, como a independência técnica e o piso salarial da categoria, por exemplo.
Dissídio coletivo
O dissídio coletivo é um documento elaborado pela Justiça do Trabalho, em observância aos termos negociados entre os sindicatos dos trabalhadores e patronal.
Seu principal ponto de diferença com a convenção coletiva é a participação do órgão da Justiça na elaboração do documento. Além disso, o dissídio também impõe um cuidado com a data-base e seu cálculo.
Data-base
Data-base é o período do ano em que, tanto os empregados, na figura do sindicato de cada categoria, quanto os patrões, na figura do sindicato patronal, se reúnem para reavaliar e também repactuar os contratos coletivos de trabalho.
É neste período que os trabalhadores, por meio do seu sindicato, podem reivindicar uma revisão salarial, assim como podem manter o acordo e/ou incluir novos termos ao contrato coletivo.
Existe uma variação em cada data-base, de acordo com as datas em que existe a negociação entre as categorias profissionais. Algumas negociações acontecem em agosto, outras em setembro e por aí vai. E a marca de cada data-base se conta sempre a partir do primeiro dia de cada mês.
Como saber a data-base para cada categoria profissional?
A informação sobre cada data-base é indicada pelo sindicato destinado a cada categoria.
Por exemplo, para trabalhadores do setor de TI em Minas Gerais, as negociações ocorrem em setembro. Logo, a data-base é dia 1o de setembro. Já para os trabalhadores de educação do mesmo estado, a data-base é maio, ficando então fixada em 1o de maio, ainda que seja um feriado.
Com o setor aeroviário não foi diferente. Em todo o país a negociação ocorre no mês de dezembro, sendo considerada a data de 1º de dezembro como data-base.
Para saber a data-base de cada categoria, basta procurar um sindicato a fim de obter a informação. Muitas vezes, os próprios sites já informam.
Quanto tempo podem durar as negociações de um dissídio?
O prazo máximo de duração para um dissídio é de 2 anos, mas existe pouco interesse em que esta negociação dure tanto tempo. Isso porque, a data-base é exatamente o momento em que se considera a aquisição dos direitos trabalhistas decorrentes do acordo ou convenção coletivos.
Isso vale mesmo se a negociação não finalizar naquele mês de início. Ou seja, imaginando que uma categoria profissional tenha sua data-base fixada em julho, mas as negociações apenas finalizem em novembro, todos os direitos acordados devem seguir seu cumprimento de forma retroativa, isto é, devem ser contados a partir do momento da data-base (no caso exemplificado, 1o de julho).
Esta questão ajuda para que as negociações não se motivem a um prolongamento quase indefinido, em até dois anos.
Dissídio retroativo
O dissídio retroativo ocorre quando é feito o pagamento das diferenças que não foram pagas na data-base do dissídio.
Neste caso, devem ser observadas a data-base e a data da publicação da nova convenção coletiva do trabalho para o cálculo do tempo em que deve ser paga esta diferença.
Tipos de dissídio
O dissídio pode ser realizado de forma individual ou coletiva.
Dissídio individual
No caso do dissídio individual simples, há uma reivindicação de apenas um trabalhador, que busca a Justiça do Trabalho contra seu empregador ou seus empregadores.
Também existe o dissídio individual plúrimo, em que mais de um empregado aciona a Justiça do Trabalho para reivindicarem contra um mesmo empregador.
Dissídio coletivo
Já o dissídio coletivo envolve o sindicato representante daquela determinada categoria profissional para negociar na justiça melhores condições de trabalho.
Os dissídios coletivos ainda podem ser divididos em duas classificações: os de natureza jurídica e os de natureza econômica.
Os dissídios de natureza jurídica são aqueles que reinterpretam leis a fim de criarem uma melhor aplicação da legislação para as partes.
Enquanto isso, os dissídios de natureza econômica criam, alteram ou extinguem normas que tenham relação com o trabalho. Quanto a isso, há alguns modelos:
Originário: aquele dissídio que levará à instituição de normas consideradas inéditas;
Revisão: o dissídio que reavalia algumas normas e condições coletivas de trabalho;
Declaração: é o dissídio que ocorre quando há paralisações por greve.
O que é dissídio salarial?
O dissídio salarial é um reequilíbrio feito de acordo com as diferenças entre o salário e a inflação.
A ideia é não permitir que o salário dos trabalhadores tenha um decréscimo em seu valor real, ou seja, que o reajuste feito compense a inflação registrada no período.
Dissídio salarial é o mesmo que aumento salarial?
Embora muita gente confunda, o dissídio salarial não é um aumento salarial, pois seu objetivo é corrigir o salário com base na inflação. Ou seja, nele apenas se busca manter o poder de compra do empregado, e não efetivamente aumentá-lo.
Para que seja efetivamente um aumento de salário, a correção deve estar acima da inflação, o que não é o caso do dissídio.
Como calcular o dissídio
Quando o conflito que levou ao dissídio é resolvido, chega a hora de calcular o seu pagamento. E muitas vezes, é nesta hora que um novo “conflito” aparece. Desta vez, a desavença pode ser com a matemática.
Cálculo do dissídio integral
O cálculo do dissídio integral é considerado o mais simples, pois inclui apenas a porcentagem de reajuste definida ao salário do trabalhador.
Então, se pegarmos uma categoria X, que obteve um reajuste de 6% naquele ano, por exemplo, e um empregado Y, com salário base de R$ 4.000,00, a conta que deve ser feita é a seguinte:
Salário base + 6% do salário base = nova remuneração
R$ 4.000,00 + R$ 240,00 = R$ 4.240,00.
Desta forma, o novo salário a ser pago para o empregado Y, após o dissídio integral, é de R$ 4.240,00.
Cálculo do dissídio retroativo
Este caso envolve mais variáveis. No entanto, sua fórmula se mantém simples para o cálculo do dissídio.
Considerando que 1º de maio seja a data-base, porém o acordo coletivo só ocorreu em agosto, somam-se aí três meses de atraso. Desta forma, no primeiro mês de início do reajuste salarial, no nosso exemplo, agosto, o empregado (que vamos chamar de Y) deve receber o valor retroativo referente aos três meses de negociação.
Salário de Y atualizado + porcentagem de reajuste x meses de atraso (no caso, 3) = remuneração do mês
No caso de Y, relacionando com o exemplo anterior, o reajuste mensal foi de R$240,00. Então, no mês de agosto, o salário dele deve ser:
R$4.240 + R$ 240,00 x 3 = R$ 4.960,00.
No mês seguinte, porém, a remuneração deve voltar ao valor com o reajuste normal, ou seja, apenas R$4.240,00, uma vez que o valor retroativo já foi pago.
Cálculo do dissídio proporcional
Se considerarmos que o empregado Y tenha trabalhado na empresa apenas 6 meses entre uma data-base e outra, há um outro cálculo a ser feito.
Isso porque, neste caso do nosso exemplo, o empregado Y só teria direito ao reajuste referente a metade do período. Da seguinte forma:
Salário base + 6% do salário base/2 = nova remuneração
R$ 4.000,00 + R$ 240,00/2 = R$ 4.120,00
O dissídio e a lei
Os dissídios são regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas, (CLT), em seus artigos 643 e 763.
Também a Constituição Federal, em seu artigo 114, aborda a questão, levando a competência do julgamento do dissídio para a Justiça do Trabalho.
Quem tem direito ao dissídio?
Está na lei que todos os trabalhadores que possuem carteira assinada têm direito ao reajuste salarial anualmente, independente de serem sindicalizados ou da exata categoria de suas atividades.
Desta forma, todo empregado pela CLT tem direito ao dissídio. E isso independe de sua categoria profissional. A única variação aqui pode ser a data-base.
E se a empresa não pagar?
As convenções e acordos coletivos têm força de lei. Por isso, em caso de descumprimento da empresa, ela deverá pagar uma multa, cujo valor é definido pela própria convenção ou acordo coletivo.
E se for demitido no mês do pagamento do dissídio?
O empregado tem assegurada uma indenização adicional que seja equivalente ao seu salário mensal se for demitido, sem justa causa, 30 dias antes do dissídio de sua categoria.
Por isso, uma dica importante para o empregador é esperar o mês do dissídio para efetuar a demissão.