Para a Today, Rafael Souto escreve sobre o fenômeno do job hopping, que, cada vez mais comum entre os jovens, também vem se popularizando no Brasil
Uma das grandes questões que os RHs têm à mesa é a falta de talentos qualificados e os desafios de retenção desse grupo. O diferencial competitivo das organizações está na união entre talento e tecnologia, e as posições estratégicas e de forte conexão com a tecnologia são as mais desafiadoras nesse contexto.
O mercado cada vez mais competitivo faz com que os talentos estejam sempre em busca de novas oportunidades. Uma pesquisa da consultoria Robert Half com mais de 1,1 mil entrevistados mostrou que 49% dos profissionais querem mudar de emprego neste ano.
Trocar de emprego é uma maneira de obter melhores salários, benefícios, desenvolvimento e satisfação profissional. Mas, uma busca incessante recai quase sempre numa prática nociva para a carreira em longo prazo, o chamado job hopping. O termo em inglês classifica a mudança frequente de empregos em um curto espaço de tempo e tem se popularizado nos últimos anos. Um estudo da Catho, publicado em 2021, mostrou que a taxa de job hopping no Brasil aumentou em 45% desde 2014.
Movimentos externos de transição são uma maneira de progredir na carreira. No entanto, o progresso exige consistência de entregas que dependem de tempo e (muito) trabalho. Pesadelo do recrutamento, o heavy job hopper corre o sério risco de percorrer uma trajetória inconsistente em longo prazo, um caminho que vai se desmanchando no ar. Na ilusão de que sempre será mais feliz em outra empresa, o profissional “pula-pula de emprego” tolera muito pouco as angústias e frustrações comuns a todos os tipos de trabalho e sai sem deixar legado.
Monika Hamori, professora de gestão na IE Business School em Madrid, tem uma extensa pesquisa publicada pela Harvard Business Review em que comprova que o job hopping não é eficaz para o sucesso profissional. Estudando a trajetória de mais de mil CEOs das maiores empresas da Europa e dos EUA, ela verificou que em média eles tinham três empregadores em suas carreiras, pelo menos até a primeira década do novo milênio. Ao verificar a trajetória de 14 mil outros executivos (não-CEOs) no mesmo período, ela constatou que foram os movimentos internos que produziram porcentagem maior e ritmo mais acelerado de promoções.
A prática de diálogos de carreira e a livre movimentação são duas estratégias organizacionais importantes de engajamento. E as empresas estão avançando neste tema. Um estudo feito pela Produtive com mais de 350 profissionais – de analistas a diretores – mostra que 62,6% percebem que a empresa dá abertura para que diálogos sobre movimentações internas aconteçam, e 78,4% conhecem os processos de recrutamento interno. Liberdade e possibilidade de experimentação são características de ambientes de trabalho em que as pessoas querem estar.
Sob a perspectiva individual, é preciso refletir sobre carreira levando-se em consideração a amplitude do tema e todas as variáveis envolvidas. Um método organizado de reflexão ajuda a tomar melhores decisões profissionais. Deliberar deve ser fruto de um processo contínuo de adaptação e ajuste às mudanças no ambiente de trabalho e nas necessidades pessoais.
Segundo a abordagem do pesquisador e professor Mark Savickas sobre life-design, a gestão da vida pessoal e profissional e consequentemente a tomada de decisão nesse campo deve estar conectada a valores, interesses e habilidades.
É saudável fazer reflexões sobre momentos de troca de empresa, mas o indivíduo deve também se preocupar com a marca que deixará nos lugares por onde passou. Transições muito curtas e impaciência na tomada de decisão fragilizam a carreira, enfraquecem a reputação profissional e dificultam o desenvolvimento de habilidades importantes, como a resiliência e a capacidade de adaptação a diferentes situações.
A reflexão que proponho é de ponderação sobre o limite entre a decisão de trocar de empresa e tolerância às dificuldades naturais em qualquer emprego. No novo mundo do trabalho, a adaptabilidade é essencial para lidar com mudanças e adversidades na carreira e permite ao profissional considerar os cenários com abertura a novos conhecimentos e oportunidades, com senso de responsabilidade e prontidão para enfrentar os obstáculos que invariavelmente aparecem.