Neurodiversidade no trabalho: decisão reacende discussão

Um funcionário norte-americano com dislexia ganhou uma ação trabalhista alegando que foi vítima de demissão sem justa causa e discriminação no ambiente de trabalho; decisão proferida pelo tribunal abre portas para a discussão sobre inclusão e neurodiversidade

A princípio, o que parecia ser apenas mais uma reunião de conselho trouxe desdobramentos e reflexões impactantes sobre a inclusão de pessoas neurodiversas no universo do trabalho. No fim de novembro, uma decisão proferida por um tribunal norte-americano considerou que houve atos discriminatórios na “demissão injusta” do gerente de instalações da instituição de caridade comunitária Marsh Farm Futures. O funcionário, que tem dislexia, atuava na empresa desde 2015 e, segundo o tribunal, foi alvo de comentários maldosos que resultaram na saída do cargo em 2021.

O episódio envolveu o ex-presidente executivo da instituição, que teria humilhado o profissional em uma reunião, ao considerar as propostas escritas por ele como ilegíveis. Em seguida, o então líder teria enviado mais críticas por e-mail, afirmando: “Em todas as suas políticas há erros e eles são incoerentes… Seu último conjunto de documentos […] foi revisado por mim e continha muitos erros. Eram desconexos e confusos. Os funcionários não concordaram em trabalhar e assinar políticas que estão mal escritas e confusas”, concluiu.

Após outro encontro, o funcionário foi, então, mandado para casa e bloqueado de todos os sistemas da empresa. Houve também uma queixa de comportamento inadequado relacionado ao profissional, que foi demitido. Buscando os direitos que lhe assistem por lei, ele entrou com uma ação judicial contra a demissão sem justa causa e obteve sucesso. Além disso, o trabalhador reivindicou que houve discriminação e assédio relacionados à neurodiversidade.

De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia (ABD), a dislexia pode ser definida como um distúrbio ou transtorno de aprendizagem na área da leitura, escrita e soletração. Uma vez que a condição acomete entre 5% e 17% da população mundial, os empregadores enfrentam desafios não só para estabelecer meios adequados no recrutamento, mas para treinar os talentos durante todas as fases atribuídas à função. Inclusive, com base em pesquisas da Academia Americana de Psiquiatria de 2023, cerca de 8 milhões de brasileiros têm o distúrbio.

Entre as condições neurodiversas, ou neuroatípicas, entram o Transtorno do Espectro Autista (TEA), TDAH, dispraxia e dislexia. Apesar de o TEA ser considerado como uma deficiência em aspectos legais, o TDAH e a dislexia não são vistos como deficiência – fato que ainda gera dúvidas entre a população em geral. 

Neurodiversidade fora do tribunal

Atualmente, a Lei 14.254 determina que educandos com dislexia, TDAH ou outro transtorno de aprendizagem tenham acompanhamento específico direcionado durante todas as fases de aprendizado, inclusive na instituição de Ensino Superior – direito que muitas vezes ainda segue sem ser atendido. Contudo, no âmbito trabalhista, são poucos os incentivos à políticas de integração – com vaga afirmativa -, capacitação e desenvolvimento.  

O ambiente empresarial enfrenta lacunas neste sentido, seja para identificar, apoiar ou fazer adaptações razoáveis às pessoas neurodiversas. Da mesma maneira, os líderes também lutam para abrir espaço e desmistificar os transtornos do neurodesenvolvimento com um olhar mais atencioso, sobretudo, porque esse público têm muita criatividade e trazem soluções inéditas e “fora da caixa”.

O especialista em Diversidade e Inclusão Thomas Nader, escreveu um artigo para a Think Work a fim de abranger os desafios ainda remanescentes da inclusão desse público. Para Thomas, ainda existe uma grande necessidade de adaptações no ambiente de trabalho, baseadas no entendimento das necessidades individuais. “As pessoas neurodiversas frequentemente têm perspectivas únicas e formas diferentes de pensar, o que pode levar a soluções criativas para problemas complexos. A inclusão pode criar um ambiente de trabalho mais inclusivo e tolerante, beneficiando todos os funcionários”, explicou.

Algumas soluções partem do treinamento e conscientização empáticos; distribuição adequada de tarefas e o próprio trabalho flexível, com espaços silenciosos ou com pouco estímulo sensorial. “À medida que mais empresas adotam práticas inclusivas e reconhecem o valor da neurodiversidade, a sociedade como um todo colhe os benefícios. É fundamental que as empresas continuem a investir em programas e políticas que promovam a neurodiversidade no mundo corporativo”, finalizou.

A biblioteca de cases da Think Work conta com diversos projetos de sucesso que relatam todo o processo desde a concepção da iniciativa, até a implementação e os resultados. Acesse nossa área exclusiva para assinantes e confira.

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