Reciprocidade Organizacional: a métrica que toda empresa deveria ter

Reciprocidade organizacional é um instrumento poderoso para entender a dinâmica entre empresas e funcionários, e promover um ambiente de trabalho mais equilibrado e produtivo

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Entre os diversos modelos para mensurar a percepção das pessoas sobre o ambiente de trabalho e avaliar a relação entre empresas e funcionários, o que acha mais eficiente é o de Reciprocidade Organizacional.

O conceito foi citado inicialmente por Gouldner em 1960. Sua proposta era entender como funcionários e empresas se enxergavam em uma relação de troca social, na qual a organização se posiciona como “doadora das condições de trabalho” para que o funcionário possa desenvolver suas atividades profissionais.

Essa troca é entendida por outros autores pela relação de dois conceitos:

Suporte organizacional percebido: o que é oferecido pela companhia aos funcionários para que possam fazer bem o seu trabalho. Isso inclui desde maquinário adequado e salário digno até o apoio da liderança e a preocupação da companhia com o bem-estar das pessoas. 

Comprometimento organizacional: o vínculo psicológico da pessoa com seu emprego e com a organização em que atua. 

Diversos estudiosos propõem que a Reciprocidade Organizacional seja fundamentada na interação entre o Suporte Organizacional Percebido (SOP) e o Comprometimento Organizacional Normativo (CON). Esse último é construído sobre a relação moral e ética estabelecida entre a empresa e seus empregados.

Na minha visão, o CON tem como um de seus pilares fundamentais o contrato de trabalho formal. Esse acordo pressupõe a existência de condições pré-estabelecidas que devem ser respeitadas por ambas as partes. Mais adequado seria usar o Comprometimento Organizacional Afetivo (COA), uma vez que esse sentimento é isento de compromissos formalmente assumidos entre empregado e empregador. 

A Reciprocidade Organizacional, contudo, representa o quanto as pessoas estão dispostas a oferecer e se conectar emocionalmente com seu empregador, em troca das condições de trabalho oferecidas.

Modelos atuais X Reciprocidade Organizacional

Pesquisas para mensurar a percepção das pessoas sobre o trabalho são comuns e aplicadas por milhares de organizações todos os anos no Brasil.

Por muito tempo, o formato ficou restrito à chamada “pesquisa de clima organizacional”; recentemente, temos visto uma transição para dois modelos mais novos: pesquisas de engajamento e mapeamentos de experiência do funcionário.

As pesquisas de engajamento têm como ponto positivo medir a conexão entre empresas e funcionários. Entretanto, a forma como os resultados são interpretados, muitas vezes, tende a atribuir a culpa de algo não está funcionando quase que exclusivamente aos funcionários,  rotulando-os como “desengajados”.

Por outro lado, as metodologias de employee experience se concentram no oposto: entender como as pessoas avaliam sua experiência com processos e práticas ao longo de sua jornada na companhia. Também vejo essa metodologia como ineficiente, pois deixa de lado uma melhor compreensão de como essas experiências influenciam na realização do trabalho e na conexão entre pessoas e organização. Neste caso, a culpa tende a cair sempre sobre a empresa, na figura do RH.

É justamente para compreender como esses dois lados se conectam – oferta da empresa e conexão das pessoas – que considero a mensuração do nível de reciprocidade organizacional mais eficaz.

Com ela, é possível entender se as pessoas deveriam ter uma conexão mais forte com o trabalho e entregar mais do que de fato estão, ou se o problema está na falta de estrutura e apoio oferecidos pela companhia para que as pessoas possam desempenhar seu papel da melhor maneira possível. 

Com base em análises de dados concretos que realizei sobre o nível de reciprocidade em centenas de empresas ao longo da última década, consegui categorizar os resultados em cinco agrupamentos. Esses agrupamentos podem ser aplicados a diversos níveis, desde indivíduos e equipes até organizações inteiras e setores. São eles:

Grupos improdutivos: são caracterizados por não possuírem os recursos mínimos necessários para realizar suas atividades e demonstram pouca disposição para se esforçar além do mínimo. Neste nível, o trabalho produzido não atinge o padrão mínimo de entrega esperado, resultando em um provável déficit para a equipe ou até para a empresa. 

Equilíbrio: ocorre quando as expectativas dos funcionários estão alinhadas com as entregas esperadas pela companhia. No entanto, ainda há espaço para evolução de ambos os lados.

Equipes de alta performance: neste cenário, além da compatibilidade entre as expectativas e as entregas, o nível de conexão alcançado entre as partes está próximo do seu máximo, tornando a relação entre empregador e os funcionários mais fluida.

Esperança de melhoria: os funcionários possuem uma forte conexão com a empresa ou têm prazer em atuar em sua área, mas percebem que o empregador não contribui da maneira esperada para que possam desempenhar bem seu trabalho. O cenário é comum em companhias que foram recentemente adquiridas ou que são os principais empregadores de região, mas que não conseguem manter o mesmo padrão de gestão de outras empresas de seu patamar. Muitas vezes as pessoas desejam permanecer na organização, mas esperam mudanças no curto ou médio prazo.

Alta exigência: ocorre em companhias onde não há uma verdadeira conexão entre as pessoas e a organização, independentemente do investimento realizado em práticas de gestão de pessoas. Isso pode resultar, por exemplo, no fenômeno do “quiet quitting” ou em taxas elevadas de rotatividade, principalmente em áreas com maior demanda de profissionais.

Como calcular a Reciprocidade Organizacional

Olhando para esses cinco agrupamentos, é provável que algumas empresas ou até mesmo áreas específicas de sua organização venham à mente como exemplos para cada um deles. 

Será que os funcionários não entregaram o esperado porque não tinham os recursos e o apoio necessários? Ou será que eles poderiam ter feito mais com os recursos disponíveis?

Para responder a essas perguntas, que estão presente em qualquer discussão sobre desempenho e gestão de equipe, acredito que o indicador de reciprocidade organizacional deveria ser medido por todas as empresas que realizam mapeamentos da percepção dos funcionários.

Essa é a maneira mais justa de determinar quem é o verdadeiro responsável quando os resultados esperados não são alcançados ou quando há uma desconexão dos trabalhadores com o emprego.

A boa notícia é que não é necessariamente preciso fazer um novo diagnóstico com os funcionários para ter essa análise. A maioria das metodologias de clima organizacional já inclui perguntas que abrangem os conceitos de Suporte Organizacional Percebido (SOP) e Comprometimento Organizacional Afetivo (COA).

Com estes dois dados em mãos, sugiro utilizar a seguinte fórmula, gerada a partir da base de estudos que realizei:

Comprometimento Organizacional Afetivo = 0,785 x Suporte Organizacional Percebido + 27,14

O resultado dessa equação deve ajudar a identificar se, dentro do universo que você está avaliando, está faltando maior suporte da organização ou se os funcionários deveriam estar mais comprometidos.

Essa é uma análise feita pelas empresas ainda sem o devido apoio em dados, levando a decisões erradas de investimentos e até de desligamentos. O risco de cometer injustiças é alto.

<strong>Matthias Wegener</strong>
Matthias Wegener

Especialista em clima organizacional e modelos de gestão de pessoas, é head de pesquisas e benchmarking na Think Work.

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Comentários Reciprocidade Organizacional: a métrica que toda empresa deveria ter

  1. Beatriz Semeghini Samençatti disse:

    Muito interessante o conceito de Reciprocidade Organizacional e a possibilidade de realizar esse cálculo com os dados que já temos. Há alguma metodologia/literatura recomendada para calcular o COA e o SOP?

  2. Matthias Wegener disse:

    Para conhecer mais sobre os modelos de comprometimento, sugiro olhar o artigo ‘The measurement and antecedents of affective, continuance and normative commitment to the organization’ de John P. Meyer, Natalie J. Allen ou outro artigo destes autores. Já sobre suporte organizacional, minha recomendação seria ‘Perceived organizational support’ de Eisenberger e outros autores. Ambos são considerados artigos de referência para estes conceitos e, mesmo já mais antigos, possuem escalas cuja essência ainda hoje é usada para montagem de questões de diversas metodologias de clima e engajamento.
    Olhando para a metodologia que vocês utilizam, sugiro considerar as assertivas que abordam as seguintes temáticas:
    – SOP: qualidade dos equipamentos e instalações; organização dos processos; justiça na remuneração; concordância com critérios de carreira; disponibilização de informações; volume de trabalho; e orientação da liderança.
    – COA: concordância com metas e objetivos da empresa; orgulho em trabalhar na empresa; satisfação com o trabalho; e internalização dos objetivos e cultura da empresa.
    Ao fazer uma média dos resultados destas assertivas, você poderá estabelecer os indicadores para estas variáveis e utilizar a fórmula indicada no artigo!

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