Síndrome da disponibilidade? Eu tenho!

Para a Today, Silene Rodrigues escreve sobre como a hiperconectividade pode trazer a sensação de que o trabalhador deve ter uma disponibilidade integral para o trabalho

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Mas será que isso existe mesmo? Síndrome da disponibilidade, o que isso quer dizer? É um transtorno ou somente uma sensação? Honestamente, eu não sei e não tenho autoridade para falar sobre transtornos mentais, mas posso afirmar categoricamente que sinto diariamente a obrigação de estar todo o tempo disponível para atender ligações, responder mensagens via WhatsApp, e-mail, redes sociais, reuniões virtuais e presenciais.

Durante muito tempo pensei que fosse algo particular, que somente eu me sentisse assim. Recentemente, entretanto, lendo alguns artigos conclui que esse é um mal muito mais comum do que imaginava, as pessoas simplesmente não se dão conta.

Para começar, é importante dizer que o Brasil é o país com a maior prevalência de ansiedade do mundo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 9,3% dos brasileiros sofrem de ansiedade patológica, seguido pelo Paraguai (7,6%), Noruega (7,4%), Nova Zelândia (7,3%) e Austrália (7%).

São cerca de 19 milhões de brasileiros convivendo com o transtorno, apresentando sintomas como pensamentos catastróficos, medo constante e preocupação excessiva.

Toda essa ansiedade está relacionada com o ambiente turbulento em que vivemos. A preocupação com a instabilidade econômica do país, o medo do desemprego, o nível de violência nas grandes cidades, índice elevado de desemprego, mudanças na economia, falta de segurança pública, etc., tudo isso ainda agravado pela pandemia que nos impôs o isolamento social e o risco real de adoecer e morrer ou perder entes queridos.

Mas não é só isso. Sinto que temos um desequilíbrio crônico entre a vida pessoal e profissional, facilitado pelas diferentes mídias. Se antes havia uma clara separação entre dias de trabalho e dias de descanso e éramos encontrados somente através de reuniões presenciais ou e-mails (que já eram excessivos), agora adicionamos com mais ênfase o WhatsApp, as redes sociais, Zoom, Teams, entre outros.

Isso significa que qualquer pessoa pode nos encontrar a qualquer momento, em qualquer lugar. Não é raro alguém ligar e ao não ser atendido, enviar um WhatsApp. Ou enviar uma mensagem pelo Teams e pelo WhatsApp, só pra garantir. 

Inclua aí o e-mail também, que é a forma mais fácil de transferir problemas e delegar responsabilidade. Quem nunca ouviu aquela frase: Ah! Mas esse assunto eu te enviei por e-mail, só estou esperando o seu retorno. Sim, e a minha caixa postal tem 500 e-mails.

Essa sobrecarga de informações que recebemos diariamente faz com que seja muito difícil nos desligarmos do trabalho e o descanso é praticamente impossível. O cérebro permanece todo o tempo conectado e alerta e a frustração por sentirmos que não estamos atendendo as expectativas dos outros ou não damos conta do trabalho só aumenta.

Quem nunca pensou como seria bom se o dia tivesse mais horas, pois somente assim conseguiria realizar todas as suas tarefas? Ou ouviu de um colega de trabalho que está sem tempo ou cheio de coisas para fazer, o que acaba invadindo as suas horas de descanso?

Quantas discussões sobre saúde mental no trabalho, meditação, mindfulness, volume de trabalho e temas relacionados acontecem entre a gestão de pessoas e as lideranças das organizações, sem uma solução efetiva?

Pois bem. Eu tampouco sei qual seria a forma ideal de esvaziar a minha mente e garantir que, mesmo quando não estou no trabalho, não esteja pensando nele ou me sentindo culpada por não ter falado com alguém, não ter entregue um relatório ou não estar em uma reunião.

Mas eu tenho certeza que a solução começa em mim mesma. Sou eu quem tenho que mudar esse status de cérebro “always on” para modo avião. É um exercício diário de escolher quais são os pratinhos que vou equilibrar e quais deixarei cair, conselho que ouvi do CEO Global de uma grande multinacional. 

E não termina aí, pois o pulo do gato é não se sentir frustrado ou culpado, pelo contrário, reconhecer que fiz o melhor que eu podia com os recursos que tinha. Trata-se de não normalizar o excesso de trabalho e estresse e a sensação de falta de tempo e baixa produtividade.

Falo na primeira pessoa porque essa é uma reflexão que venho tendo há tempos, mas espero que o texto ajude muitas pessoas por aí que também se sentem assim.

<strong>Silene Rodrigues </strong>
Silene Rodrigues

Diretora de recursos humanos na Adidas.

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