Para a Today, Thiago Liguori escreve sobre o papel das empresas no apoio à funcionários em transição de gênero
Pergunto se Rita Lee estivesse numa roda de conversa conosco, profissionais de RH, o que ela diria para as empresas que ainda não sabem lidar com a diversidade, como de pessoas mais velhas, de outras origens e, principalmente, pessoas trans. Fazendo um exercício de fantasia, diria que ela seria sucinta nas palavras e explosiva nas ações. Rita Lee deu o impulso que faltava para muita gente se assumir ou mesmo mudar. É hora de levar essa resolução também para a mesa de decisões das companhias.
Comecemos com uma pergunta: como as organizações, para além de banners e peças sobre diversidade, estão agindo e cuidando de seus funcionários LGBTQIA+?
Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019 existiam cerca de 211 mil pessoas autodeclaradas transgêneras no Brasil. No mundo inteiro, há uma tendência de cada vez mais jovens se afirmarem trans. Uma análise da Gay & Lesbian Alliance Against Defamation (Glaad) indica que, em 2017, 6% dos membros da geração X se reconheciam como trans ou não se enquadravam na concepção binária de gênero masculino-feminino. Entre os millennials (a geração Y, dos nascidos entre 1981 e 1995), o número era de 12%.
Essas pessoas são nossos colegas de trabalho, profissionais dedicados e seres humanos de relevância para muitos ambientes. No entanto, um outro fato nos intrigava: no segmento da saúde, faltavam profissionais capacitados para lidar com essas pessoas no momento em que mais precisavam, ou seja, em sua transição de gênero.
Essa é a história de Gabriel Seabra, um homem trans que há anos tinha dificuldade de encontrar acolhimento sobre esta questão junto a um profissional de saúde, assim como tantos outros. Ele buscou ajuda no Sistema Único de Saúde (SUS) e também na rede privada, mas, sem orientação, não recebia o suporte necessário. “O SUS está sobrecarregado, e o plano de saúde muitas vezes não tem profissionais preparados para atender a população trans”, conta. Vivendo esse drama, Gabriel descobriu em um webinar oferecido pela Pipo em sua empresa, Z1, algo que poderia ajudá-lo.
É aqui que entra a Pipo, uma corretora de saúde que oferece, como diferencial, um cuidado exclusivo e atenção em pontos que, muitas vezes, são deixados de lado. Nosso lema é “inclusão na prática”, por isso, vamos a organizações falar sobre a nossa linha de cuidado desenvolvida especialmente para pessoas em transição de gênero.
Nesse projeto, nós damos todo o suporte e ajudamos os trabalhadores das empresas clientes a encontrar os profissionais adequados para que o processo ocorra da melhor forma. A iniciativa abrange tanto o apoio psicológico quanto o próprio tratamento de transição. Graças a esse protocolo, que não tem nenhum custo para as pessoas nem para as empresas, Gabriel recebeu – e segue recebendo – a atenção que precisava. “Hoje tenho um médico fixo”, ele conta.
Sabemos que estamos no país que mais mata pessoas trans e que esse grupo enfrenta um maior risco de desenvolver problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão, justamente pelo preconceito, violência e os estigmas que vivem. Por isso, nosso protocolo é um projeto que nos enche de orgulho e merece ser compartilhado com um público cada vez maior.
No Protocolo Pipo para Pessoas Trans, iniciado em junho de 2022, decidimos considerar três pilares. O primeiro é o acolhimento da pessoa que deseja passar pela transição. Assim, nossa equipe de saúde trabalha em parceria com o departamento de Recursos Humanos das empresas, divulgando informações sobre os serviços disponíveis e ajudando a criar um ambiente inclusivo e acolhedor dentro das organizações.
O segundo pilar envolve a terapia hormonal para a transição de gênero, guiado pelo protocolo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia. Nesses casos, nós entendemos que podemos oferecer apoio emocional, orientação e prescrição da terapia hormonal, quando indicada, além do acompanhamento com exames laboratoriais e sinais de efeitos colaterais.
O tratamento é personalizado, levando em consideração o histórico de saúde e as preferências individuais da pessoa no caminho para a afirmação de seu gênero. Além disso, compreendendo a importância do suporte psicológico durante todo o processo, a Pipo direciona os indivíduos para psicólogos especializados no tema.
Vale destacar novamente que todo o serviço é oferecido de forma gratuita, tanto para a pessoa em transição quanto para a empresa cliente Pipo. Os procedimentos médicos são realizados por meio da rede credenciada dos planos de saúde.
O terceiro pilar do nosso protocolo diz respeito à cirurgia de afirmação de gênero, caso a pessoa tenha interesse em realizá-la. Essa cirurgia não é obrigatória para a pessoa fazer parte do projeto da Pipo. No entanto, quando esse é o desejo da pessoa acolhida, prestamos o auxílio no processo de liberação da cirurgia junto ao plano de saúde, orientando sobre os passos necessários e os possíveis caminhos para o reembolso, uma vez que nem todos os planos cobrem esse tipo de procedimento.
A interação com outros profissionais de saúde – que estão envolvidos no cuidado da pessoa – segue sendo um desafio. Ainda são poucos os que receberam treinamento ou têm conhecimento sobre a terapia hormonal e cirurgia de afirmação de gênero para pessoas trans. Por isso, também temos trabalhado em parceria com as operadoras de saúde para promover a conscientização e a capacitação de seus profissionais. Inclusive, já desenvolvemos um treinamento sobre como atender a população LGBTQIA+ focado em profissionais de saúde.
De acordo com o Ministério da Saúde, o número de procedimentos de redesignação sexual realizados pelo SUS aumentou de 19 para 304 entre 2008 e 2017. Ainda assim, o acompanhamento dessas pessoas em períodos anteriores à cirurgia e no pós-operatório segue precário, principalmente no que diz respeito a questões específicas desse público.
Aqui, a gente para e pensa na nossa atuação. Num cenário em que o RH pode não saber lidar com a questão, o SUS ainda não conquistou o alcance e a descentralização necessária para essa demanda e os planos de saúde estão ainda iniciantes sobre o tema, a Pipo cumpre um papel de juntar as pontas. É em situações assim que nosso diferencial contribui para fazer a diferença em todo um sistema, oferecendo um serviço que nenhuma corretora faz e trazendo valor e tranquilidade para o RH.
Ainda há muito a ser feito. Mas os relatos que recebemos dão sentido ao nosso trabalho e nos enchem de força para irmos em frente. Um desses depoimentos que emocionam é do próprio Gabriel, do começo deste texto: “Me sinto cuidado, orientado. Fazia anos que não tinha um médico fixo, e hoje tenho”, ele diz.
“Um belo dia resolvi mudar.” Quando menciono esse trecho de Rita Lee não estou falando da mudança física vivida pelas pessoas trans. Entendo que, para elas, a transição acontece de uma forma muito diferente. O “belo dia” a que me refiro é para a mudança das empresas: quando elas começarem a praticar, de fato, a diversidade e a inclusão que tanto almejam.
Nossa abordagem compassiva e personalizada vai seguir ajudando a transformar a jornada de pessoas em trans, com o apoio necessário para que se sintam consideradas e respeitadas em todos os aspectos de sua saúde.
Essa edição da Think Work Today é um oferecimento da Pipo, corretora de benefícios de saúde.
Thiago Liguori
Diretor de Saúde da Pipo, médico cardiologista pelo Hospital Sírio-Libanês, pós-graduado em Telemedicina e Seg. Digital pela USP e especialista em Inovação e Empreendedorismo por Stanford.