Patrick Schneider analisa como os memes e a percepção pública se tornaram novos desafios para a gestão de pessoas e para a reputação das empresas
Por muito tempo, no mercado de trabalho, as organizações competiam por prêmios que lhes concedessem o selo de ótimo empregador, tornando-se instantaneamente o sonho de muitos profissionais em diversos níveis de carreira.
Havia, nesse período, revistas de referência que eram lidas, pois ditavam tendências ao compartilharem práticas organizacionais que as habilitavam a concorrer a tais premiações. Posteriormente, superando em quase 15 anos esse estágio anterior, as redes sociais, principalmente o LinkedIn, assumiram esse papel.
De modo orgânico ou impulsionado, vagarosamente as empresas passaram a ter seus ritos culturais decodificados, mostrando tanto seu lado positivo quanto o negativo. Vale destacar que, muitas vezes, se você queria conhecer o lado negativo de uma companhia, a plataforma “Love Mondays”, adquirida pelo Glassdoor, entregava cada detalhe, desde a seleção até a remuneração por cargos.
Atualmente, estamos vivenciando um momento em que a área de Recursos Humanos e os elementos que compõem a cultura organizacional passaram a figurar em “memes” em todas as redes sociais.
Pessoas empregadas, que investem pesadamente em certificações para desenvolver suas carreiras, demonstram, por meio da sátira, como é trabalhar nas organizações por onde passaram ou onde ainda atuam.
Confesso que fico em dúvida se a intenção é atingir um nível de engajamento tão alto que permita trabalhar apenas como influenciador, ou se a tentativa é expor como algumas práticas – que já não fazem o menor sentido – ainda são levadas a sério.
O limite entre o profissional engajado e o hater nas redes sociais pode ser uma sessão de feedback mal conduzida, um desentendimento sobre o tempo de almoço ou a necessidade de interações forçadas, celebrando coisas que só fazem sentido na cabeça de quem agendou a tal celebração.
O pós-pandemia decretou o fim do happy hour entre colegas de trabalho, uma reclamação comum da Associação de Bares e Restaurantes no Brasil. Esse é um sintoma que mostra no que o ambiente de trabalho se transformou para as pessoas: trabalho é trabalho.
Talvez o trabalho tenha sido romantizado por muito tempo; numa época que condenava como pecadores aqueles que não demonstrassem amor pelo empregador.
Reflito e suavizo esse comportamento em conversas com colegas de RH, observando que estamos interagindo dentro das companhias com uma geração que se comunica por meio de memes. Vide um dos pontos altos da última edição do Rock in Rio, que questionou “Que show da Xuxa é este?” ou “Meu nome é Julia”, provocados pela própria Katy Perry, que já sabia do curto vídeo viral que praticamente ganhou ares de co-parceria na música “Dark Horse” da cantora californiana.
A verdade é que poucas são as organizações que têm discutido de frente os efeitos desses memes. Na minha visão, o espaço entre as gerações Boomer, X e Y não é nada comparado ao abismo que separa todas essas dos representantes geracionais dos anos 2000 para frente, já presentes no mercado de trabalho.
Sentado à mesa de um restaurante corporativo, é possível perceber de 5 a 10 pessoas por mesa com celulares na mão, rindo dos mesmos memes entre si, mas sem emitir um som. Também é possível ver os críticos desse tipo de comportamento ao redor, embasbacados com a velocidade em que aqueles digitam nos teclados virtuais de seus telefones.
Nesse ecossistema construído, sobram opiniões para todos os lados e empresas que oferecem plataformas de automação de processos seletivos acabam virando alvo, seja pela falta de retorno após o processo seletivo seja por incluir etapas demais no processo sem deixar claro o porquê de determinadas perguntas no formulário de aplicação para uma vaga.
Ao longo de 2024, novas plataformas surgiram na brecha deixada pelas empresas tradicionais que foram criticadas. Os clientes que utilizam essas plataformas não passam impunes.
O meme que usa a capa do disco cinquentenário intitulado “Chico Buarque de Yolanda” para narrar “vi a vaga na empresa dos sonhos, a plataforma era XYZ”, com o semblante feliz de Chico na primeira metade do texto e com o Chico triste na segunda metade, foi um dos mais compartilhados nos últimos dois anos para mostrar que determinadas marcas usavam em seu processo seletivo plataformas de seleção alvo de críticas.
Um dos elementos que mais me impacta é a campanha anti-CLT promovida nas redes sociais. Até a minha geração, tudo o que mais se queria era ter o primeiro contrato na carteira de trabalho e, para isso, os profissionais fechavam os olhos para os eventuais vícios de determinada cultura, focando sempre nas virtudes enaltecidas pelo LinkedIn – a mesma rede que hoje escancara longas mensagens de despedida que revelam níveis de toxicidade de uma cultura organizacional que antes ficava guardada a sete chaves.
O reflexo dessa jornada ainda será sentido nos próximos capítulos deste mercado em transformação.
A verdade é que trabalhar marketing interno utilizando-se de memes facilita a conexão com os profissionais, principalmente com os proliferadores de memes, que nos divertem, fazem pensar e, em alguns casos, causam dor de cotovelo.
Este último elemento pode ser sentido sempre que o discurso e a prática se descolam do dia a dia da empresa. Casos como a decisão pela extinção do home office ou o tratamento dado ao tema Diversidade, Equidade e Inclusão.
Entendo que, cada vez mais, estar atento a esses comportamentos sociais será importante para companhias que desejam se posicionar em um mercado de trabalho que, pouco a pouco, vai perdendo o brilho outrora reverenciado.
Adaptar-se é preciso; estar atento também. Eu, por aqui, me mantenho curioso sobre esses tipos de manifestações que, ao fim do dia, são elementos culturais que desafiam os ambientes estabelecidos dentro das organizações. Enquanto isso, seguimos rolando as timelines dentro desse espelho escuro, sem clareza se o observamos ou se somos observados.