Silene Rodrigues fala sobre a coragem de encerrar um ciclo profissional e construir novos caminhos
Já sentiu que está “cumprindo tabela” no trabalho? Que o brilho nos olhos deu lugar à rotina, e o entusiasmo foi substituído por uma sensação silenciosa de desconexão?
Como executiva de RH, acompanhei muitas transições, algumas planejadas, outras abruptas. Mas há um padrão que se repete: ignorar os sinais de que um ciclo chegou ao fim costuma sair caro. Para a carreira, para a saúde emocional e, muitas vezes, para a reputação.
Eu mesma já vivi situações assim, e aprender a reconhecer quando um ciclo está se encerrando foi um dos movimentos mais transformadores da minha trajetória.
Não existe uma fórmula exata – afinal, somos indivíduos únicos, com aspirações, motivações e preferências distintas. Mas os sinais… eles são claros para quem se permite enxergar. E são justamente esses sinais que, quando ignorados, podem nos manter presos em lugares aos quais já não pertencemos. Alguns aparecem sutilmente, outros gritam. O importante é saber identificá-los.
Você já não se reconhece no propósito da empresa. A motivação virou esforço. O aprendizado estagnou. O ambiente pesa mais do que inspira. Seus valores mudaram, enquanto tudo ao redor parece ter ficado no mesmo lugar. Esses sinais não devem ser ignorados. Eles não são ameaças, são convites à reflexão.
A neurociência nos ajuda a entender que o cérebro não apenas reage ao esgotamento — ele também sinaliza quando é hora de mudar. Em ambientes que não estimulam nosso sistema de recompensa, há queda na liberação de dopamina, neurotransmissor ligado à motivação e ao prazer. Isso gera apatia, procrastinação e até sintomas físicos como fadiga, insônia e irritabilidade.
Por outro lado, ao visualizar metas alinhadas ao nosso propósito, ativamos áreas cerebrais responsáveis por planejamento, foco e ação. E tem um detalhe fascinante: o cérebro não distingue muito bem o que é real do que é imaginado. Ou seja, ao visualizar-se em um novo cenário — mais alinhado, mais leve, mais seu — você começa a construir esse futuro no íntimo. É como ensaiar mentalmente antes de subir ao palco.
E o que fazer quando percebe que o ciclo está fechando? Primeiro, pare. Reflita. Escute. Antes de qualquer movimento, olhe para dentro. O que mudou em você? O que ainda faz sentido?
Depois, planeje com inteligência. Transições bem-sucedidas não nascem da pressa. Exigem estratégia, rede de apoio e preparo emocional. Busque aliados, mentores, colegas de confiança, profissionais de carreira. Conversar abre caminhos e clareia decisões.
E atualize-se. Às vezes, o próximo passo exige novas competências. Invista em você antes de dar o salto.
Tenha em mente também o que não fazer. Não dramatize. Encerrar um ciclo não é fracasso, é evolução. Não se isole. Compartilhar dúvidas é sinal de maturidade, não de fraqueza. E não saia sem plano. A liberdade profissional é poderosa, mas precisa de estrutura para ser sustentável.
A forma como você encerra um ciclo diz muito sobre quem você é. Seja transparente, grato e profissional. Honre sua trajetória, mesmo que tenha sido difícil. Deixe portas abertas, o mundo corporativo é menor do que parece.
O fim de um ciclo não é um ponto final. É uma vírgula que antecede um novo capítulo. Se você sente que seu “prazo de validade” está vencendo, talvez seja hora de parar de renovar o contrato emocional com algo que já não te representa. A coragem de mudar começa com a coragem de reconhecer.
E aqui vai uma dica final: seu cérebro é um excelente arquiteto de futuros. Mesmo antes de você tomar uma decisão concreta, ele já trabalha nos bastidores. Ao começar a imaginar um novo ciclo profissional, ele ativa áreas responsáveis por planejamento e ação, como se dissesse: “Ok, estamos indo para outro lugar. Vamos nos preparar.”
Essas manifestações internas – como aquele frio na barriga misturado com empolgação, ou aquela vontade de começar algo novo mesmo sem saber exatamente o quê – são sinais de que o futuro já está sendo construído. E ele começa dentro de você.