Inveja ou ambição? Como distinguir no trabalho

Robson Gonçalves analisa como a linha tênue entre inveja e ambição revela mecanismos inconscientes que influenciam nossas relações e decisões no trabalho

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A inveja no ambiente de trabalho pode ser incômoda. Mais ainda: pode contribuir para gerar os tais “ambientes tóxicos” – sejam eles definidos como for. Mas até que ponto não existe algo bom na raiz desse sentimento, um tipo particular de libido capaz de nos mover na direção daquilo que ainda não temos ou somos, mas que vemos com um certo despeito em outra pessoa?

Quando tratamos de sentimentos (as representações mentais das emoções), é preciso atenção. Sentimentos e emoções são coisas sérias. Mas uma habilidade cada vez mais rara é a capacidade de identificar esses estados afetivos e compreender como eles condicionam nossas escolhas e comportamentos.

O complicado é que existe uma fronteira tênue entre inveja e ambição. E isso por uma razão simples: elas fazem parte de um contínuo. Misture desejo e comparação interpessoal. Pronto! Eis o tal contínuo.

Quando vemos o sucesso de alguém e aquilo desperta nossa atenção, desejamos conseguir o mesmo. Isso pressupõe que estamos nos comparando àquela pessoa. Mas isso pode ser um sentimento breve, um flash, como alguém que assiste a um show de rock e, por um instante, se imagina no palco como um ídolo pop. Ao final do show, indo para casa, talvez essa pessoa nem se lembre daquele lampejo.

Mas quando um colega que trabalha lado a lado conosco é promovido e nós não, tudo pode ser diferente. “Por que não eu?” É a pergunta que talvez surja em nossa mente de forma espontânea. Essa certa frustração é a porta de entrada para o contínuo afetivo no qual estão tanto a inveja quanto a ambição.

Um ponto crítico, um marcador típico para saber se estamos sendo invejosos ou ambiciosos, é a dor. Dor emocional, dor moral, “dor de cotovelo”. Todo invejoso sofre com o sucesso alheio. No caso da ambição é diferente. Ela desperta em nós o que Nietzsche chamou “vontade de potência”, um tipo de gana, de “sangue nos olhos”, algo como “Eu também vou chegar lá. Não foi dessa vez, mas tudo bem. Vamos em frente!” Enquanto o invejoso permanece onde está e quer trazer de volta os que seguiram adiante, o ambicioso se vê como o próximo a continuar a jornada.

A Psicologia Individual de Alfred Adler, um autor cada vez mais valorizado hoje, também nos ajuda a distinguir inveja e ambição. Para Adler, somos muito sensíveis a ameaças. E assimetrias de poder, em geral, são interpretadas assim, sejam elas causadas pela promoção do colega ou pelo carro novo que o vizinho comprou.

Na inveja, agimos de forma regressiva. Se pudéssemos, eliminaríamos a assimetria desempoderando ou outro, ainda que “puxando o tapete” dele, sabotando, trapaceando. Na ambição, agimos de forma progressiva, buscando eliminar a assimetria por meio do nosso próprio empoderamento.

Entre a “dor de cotovelo” sabotadora e o “sangue nos olhos” empoderador, a ambição será sempre um estado de espírito melhor e mais saudável.

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Foto de Robson Gonçalves

Robson Gonçalves

Economista comportamental e neuropsicanalista, coordena os cursos de Neurobusiness da Fundação Getulio Vargas. Na Think Work, escreve sobre neurociência, liderança e relações humanas nas organizações.

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