Extraindo o melhor da liderança

É preciso saber dar as ferramentas e apoio para que a nova geração de líderes possa entregar os melhores resultados para a sua empresa, escreve José Renato Domingues para a Today

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36 anos, tatuado e fã do Nirvana, com quase de 11 anos de experiência onde atua, esse líder tinha um comportamento mais difícil no início: era radical, de pouco diálogo, impunha suas opiniões e ouvia pouco. Mas, nos últimos anos, foi evoluindo. Amadureceu e construiu importantes alianças até ser escolhido como o líder número 1. Não por um board, mas pela população de um país aqui pertinho, o Chile. Falo de Gabriel Boric, que tomou posse com o mais jovem presidente de sua nação. 

Com maioria de mulheres no seu gabinete, Boric se mostra inclusivo, muito próximo às causas sociais e com sensibilidade política para negociar acordos, já que não tem maioria no Congresso para governar. Chegou ao topo da carreira cedo, mas sabe que precisa aprender e crescer. Agora, trago vocês, nossos leitores aqui na Think Work, para a cena. Qual seria a sua estratégia para desenvolver esse líder? Como você faria e que instrumentos, ferramentas e processos colocaria à disposição dele para que crescesse em sua liderança, mesmo tendo que entregar resultados concretos para os seus constituintes? Na sua empresa, há líderes “que não estão prontos” em posições de destaque e responsabilidade? Como são vistos e qual a sua confiança de que a empresa será melhor com eles na liderança?

Em minhas mentorias, venho dialogando com líderes que são muito parecidos com Boric, seja pela idade, pelo perfil ou pelo tamanho dos desafios que precisam superar. Desafios que foram dados a eles exatamente por serem de uma geração que pode (e quer) construir empresas, negócios e mercados com foco no futuro. Gabriel Boric foi eleito com uma plataforma voltada para o futuro do seu país, que precisa ser construído, sem fórmulas prontas do passado para serem usadas. Em muitas das startups com as quais me relaciono, é fácil traçar um paralelo com essa situação da esfera política. Meu foco, nesse caso, tem sido em reforçar os pontos fortes o máximo possível dos líderes e buscar pessoas competentes naquelas habilidades nas quais não são tão preparados. Não dá tempo de focar nas fraquezas se você já está liderando uma transformação.

Quero deixar uma referência sobre essa forma de desenvolver líderes, criada pelo psicólogo Don Clifton e que se tornou uma metodologia de avaliação e crescimento amplamente usada pela Gallup. Para saber mais sobre isso, indico também o livro “Strenghts Based Leadership” – vale a pena comprar, já que você ganhará um assessment sobre suas fortalezas. E uma maneira leve e divertida de ver isso na prática é com a série da AppleTV+ “WeCrashed”. Ela conta a história de ascensão e queda da WeWork e traça o perfil de seu CEO, Adam Neumann – um típico líder de startup que assume enormes responsabilidades muito cedo e precisa exercer sua liderança baseada em pontos fortes por falta de tempo para focar em suas fraquezas. Pela narrativa da série, faltou mentoria, na minha opinião, para Neumann. Boric, por exemplo, já se cercou de ótimos mentores há alguns anos.

Mas não só de líderes da nova economia vive o nosso ambiente corporativo, certo? Ainda traçando paralelos com os líderes mundiais mais em evidência do momento, quero falar sobre Putin e Zelensky, presidentes da Rússia e Ucrânia, respectivamente. Mais do que eles, cujas biografias e estudos estão amplamente disponíveis, quero abordar os impactos que seus estilos de liderar geram. Em um artigo vasto, Otto Scharmer nos guia em como enxergar o que Putin ignorou e ainda não sabe ver e aquilo que Zelensky foi capaz de alavancar como ninguém em uma escala planetária: o poder das ações coletivas. 

Zelensky mobilizou a sociedade ucraniana (e de dezenas de países) e a transformou em sua maior força contra a invasão armada convencional que Putin está usando na Ucrânia. Em um podcast muito bem estruturado da série WorkLife, o guru corporativo Adam Grant conta em detalhes quem é Zelensky, quais as suas forças e porque ele é um fenômeno social de impacto do nosso tempo. Na mesma sessão, detalha o que faz de Putin um líder retrógrado, mal preparado e incapaz de comunicar sua missão e seu propósito aos seu próprio povo. Essas fontes não são isentas e totalmente independentes, mas fazem um esforço para olhar os aspectos mais sistêmicos e complexos dos perfis de ambos os líderes.

Eu tenho encontrado, convivido e trabalhado com muitos “Putins” e vários “Zelenskys” também e aprendi a identificar suas características rapidamente, além de criar estratégias para trabalhar com ambos – minimizando os impactos deletérios dos primeiros e ajudando a amplificar a voz e as ações dos segundos. Eles representam, para mim, a transição clara do que precisa parar de acontecer nas empresas e do que precisa ser criado. 

Putins se isolam (lembram das imagens das reuniões do original líder russo em mesas de seis metros com seus auxiliares e mesmo com outros líderes mundiais que o visitaram?). Criam mecanismos de medo e controle para que suas equipes não se relacionem, formam feudos e premiam seus auxiliares diretos por só lhes bajularem e reforçarem seu ego já distorcido; procuram anular e desqualificar as visões divergentes de pares, já que enxergam neles uma ameaça ao seu “domínio” sobre aquela área da empresa, sobre a “sua” unidade de negócio. 

São violentos, promovem assédio e encobertam quem os pratica. São tolerados em conselhos de administração, comitês executivos e nas médias gerências por terem algum tipo de qualidade técnica, conhecimento ou networking que ainda não pode ser substituído. São dinossauros em termos de práticas de gestão e usam as vitórias do passado para justificar continuar usando essas mesmas ações. Não são e não sabem o que é ser um parceiro de equipe, são sós e afastam as pessoas. São o motivo pelo qual muita gente abandona uma empresa.

Os Zelenskys das nossas empresas, por sua vez, vêm sendo identificados com grande facilidade, já que são líderes para os quais as pessoas querem trabalhar: pedem para ir para sua área ou unidade de negócio e alguns mudam de profissão ou de carreira para poder trabalhar com eles. São ímãs de pessoas e são convidados com frequência para fazer parte de projetos estratégicos por sua capacidade de aglutinar, construir parcerias e formar times. Habilidades essas que são tão necessárias para o sucesso empresarial. Se comunicam com muita alegria, entusiasmam suas audiências, empolgam pela fala, que constrói visões de futuro, e modulam essa comunicação de acordo com o público alvo. E isso é visto com admiração, pois mostra capacidade adaptativa e foco no interlocutor, ampliando o alcance de sua mensagem. Aprendem rápido e a partir de muitas fontes. 

Meu papel tem sido usar o que acontece no nosso entorno, na sociedade em geral, para ampliar nossa visão de dentro das organizações empresariais e aprender a torna-las mais permeáveis ao que acontece “lá fora” de modo que as pessoas “aqui dentro” não se sintam alijadas ou desconectadas do mundo que vivem. Que possamos, portanto, observar e fazer escolhas conscientes em relação aos Borics, Putins e Zelenskys com os quais nos encontramos. 

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<strong>José Renato Domingues</strong>
José Renato Domingues

É conselheiro, executivo e investidor anjo em startups. Atua como conselheiro de administração em grandes empresas e é vice-presidente corporativo na holding da CTG. Escreve sobre as mudanças na sociedade para a Think Work.

Comentários Extraindo o melhor da liderança

  1. Cadu Lemos disse:

    JR, muito bacana os paralelos entre o Buric, Zelensky, Putin e os ‘meninos’ das Startups. A série WeCrash mostra bem como um potencial gigante pode ser perdido por falta de um suporte com janela e experiência.

  2. Marcelo disse:

    Zé Renato, parabéns pelo artigo. Excelentes reflexões.

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