Você está preparado para a disrupção social?

José Renato Domingues alerta para a disrupção social, um movimento similar aos vistos com tecnologia, quando um padrão emerge de forma abrupta e abala o que era conhecido

O mundo corporativo se dividiu com a notícia de a cantora Anitta ser a nova integrante do conselho de administração do Nubank. De um lado, executivos se mostraram céticos sobre o papel da conselheira (“Deve ser uma jogada de marketing”, diziam), preocupados com o que isso poderia representar para o órgão máximo de governança de um banco. No outro extremo, pessoas celebravam: uma mulher negra, da periferia, ascendente social e sem nenhuma formação em negócios provando que as empresas são para todos. Mais do que isso: o jeito de a Anitta expor seu corpo, sua sexualidade, sua intimidade a 54 milhões de seguidores também mostrou que a manifestação extrema, nas mídias e nas redes sociais, pode ser um atributo vencedor no comportado e sisudo ambiente dos negócios.

Dias depois, em uma entrevista a Pedro Bial, o governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite falou publicamente pela primeira vez sobre ser gay e ser governador, e dos estigmas dos políticos que querem se manter íntegros em suas vidas privadas e públicas. E falou sobre amor, inclusive por seu namorado, em contraste às falas da arena política que têm sido, predominantemente, de ódio. Na repercussão, novamente os extremos: o político foi hostilizado e atacado, mas também virou herói e símbolo de uma nova era de transparência.

O que se passa na sociedade para termos reações tão diversas?

Tenho estudado esse tema para compreender o que é relevante e precisa entrar na agenda das corporações, de modo a afetar as políticas e as práticas de gestão. Minhas leituras, conversas e reflexões apontam para uma disrupção social, um movimento similar aos vistos com tecnologia, quando um padrão emerge de forma abrupta e abala o que era prática prevalecente e incumbente.

Mudanças sociais sempre ocorreram, transformações sociais também. Meu paralelo com o mundo da tecnologia é que, desta vez, há uma convergência de temas.

Ilustro com aqueles que já estão na pauta das empresas: movimentos antirracistas, LGBTQIA+, empoderamento feminino, agenda ambiental, trabalho remoto. Cada um com a sua pauta, ganhando força nas redes sociais e na mídia, começando a se fundir no espaço empresarial, formando um tecido cultural completamente novo e que não sabemos onde irá nos levar.

Pascal Finette, professor da Singularity University, uniu alguns pensadores para discutir sobre diversos tipos de inovação e disrupção. Ele adaptou uma frase de Ernest Hemingway (originalmente escrita para falar sobre falência) para expressar como acontece a mudança radical: “Gradualmente e, então, de repente!”.

Se é assim, como nos preparamos para a disrupção social? Segundo Pascal, construindo cenários sobre o futuro. 

A técnica de planejar cenários surgiu na Shell nos anos 1970 e vem sendo aperfeiçoada desde então. Consiste basicamente em olhar para o futuro de maneira a procurar possíveis e plausíveis ambientes para o qual um negócio, um setor ou uma sociedade encaminha e fazê-lo de uma forma que possamos aprender como nos comportar em cada uma das realidades. Construímos narrativas detalhadas desses futuros e perguntamos: Quais competências precisamos ter? Quais ferramentas devemos aprender a usar? O que será essencial para o sucesso em cada um desses mundos? Quem ganha e quem perde?

Quanto mais minuciosos e descritivos forem os cenários, melhor saberemos essas respostas. E, sabendo as respostas, conseguiremos nos antecipar, usando o tempo a nosso favor. Não importa qual será o futuro que a convergência dessas forças sociais irá criar, mas ele já apresenta sinais de sua evolução.

Portanto, não deveríamos olhar para Anitta e Eduardo Leite tentando nos posicionar em algum ponto extremo das opiniões. Precisamos olhar para eles como sinais de mudanças que já estão acontecendo, vislumbrar como podem se desdobrar e formar novos padrões sociais, novos conjuntos de valores e crenças que determinarão o comportamento humano daqui a alguns meses e anos. E precisamos aprender rápido o que precisa ser aprendido − para adaptar nossas organizações àquilo que os humanos do futuro esperam encontrar nas empresas.

José Renato Domingues
José Renato Domingues

É conselheiro, executivo e investidor anjo em startups. Atua como conselheiro de administração em grandes empresas e é vice-presidente corporativo na holding da CTG. Escreve sobre as mudanças na sociedade para a Think Work.

Comentários Você está preparado para a disrupção social?

  1. Thiago disse:

    Ótima reflexão! Obrigado 🙏🏻

  2. Sérgio Luis Rodrigues disse:

    José Renato, parabéns! Excelente tema para reflexão 👏👏👏

  3. Sempre pensando muitooooo a frente! Visionário puro !

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